Pode parecer estranho sugerir, mas quase 30 anos após o nascimento da internet comercial, o setor automotivo vive seu momento de ‘Napster’.
Assim como a indústria da música mudou completamente em 1999 com o advento do compartilhamento de arquivos, já houve disrupção digital na indústria automobilística. Mas agora entram em jogo uma série de fatores que mudarão o setor para sempre, abalando velhas relações e forjando novas.
E embora ainda esteja longe de ser certo como será o equilíbrio de poder daqui a alguns anos, uma coisa é certa: o novo ecossistema automotivo será impulsionado pela colaboração de dados.
Os impulsionadores da mudança
Há quatro mudanças principais por trás da agitação atual.
i) A migração do motor de combustão interna para a energia elétrica: em dezembro de 2022, um terço dos carros novos registrados no Reino Unido eram EVs (32,9%). Isso é quase três vezes a participação de mercado que eles detinham em janeiro do ano anterior (12,6%). Isso também significa que os postos de gasolina estão se tornando menos importantes, pois os pontos de carregamento em casa e na estrada se tornam mais significativos. Assim, o papel das grandes empresas petrolíferas está diminuindo à medida que aumenta o das empresas de serviços públicos.
ii) A mudança de concessionárias para modelos diretos ao consumidor e agências: se você compra um carro novo hoje, normalmente ainda vai a uma concessionária. Mas, em vez de seguir esse modelo, marcas disruptivas como Tesla e Polestar adotaram uma abordagem mais D2C. Você pode testar o carro no local , mas conclui sua compra online.
iii) O aumento da mobilidade como serviço e a capacidade de fornecer atualizações sem fio para veículos: o software do veículo – e, consequentemente, todos os recursos que ele controla – passaram a ser atualizados sem fio, assim como seu telefone ou laptop. De fato, conforme relatado no TechCrunch, a GM afirmou que seu serviço de assinatura deve gerar US$ 25 bilhões até 2030, semelhante a serviços como Spotify e Netflix. Isso adiciona outro fluxo de receita para os fabricantes, que podem cobrar pelos recursos via assinatura (aquecer o volante no inverno, por exemplo). Também lhes dá a oportunidade de construir um tipo de relacionamento com seus clientes que não era possível antes, em que só podiam comunicar com eles quando trocavam de carro ou seja após vários anos.
iv) O crescimento de parcerias de valor agregado dentro do ecossistema emergente:os fabricantes estão se conectando com as novas redes de carregamento para oferecer carga com desconto, por exemplo. Mas eles também poderiam fazer parceria com empresas como a Starbucks – tal como a Volvo fez nos EUA– para oferecer aos condutores descontos em café ou lanches enquanto esperam que seucarregue.
É tudo uma questão dedados
Por trás de tudo isso estão os dados e como esses dados podem ser usados para melhorar a experiência dos clientes, criando vantagem competitiva para os vários negócios.
Por exemplo, a LiveRamp tem uma parceria com o site de compra de carros Carwow. As pessoas estão usando o site Carwow para configurar seu carro ideal, reservar um test drive e obter um preço. Outros vendedores de automóveis estão usando esses dados de intenção de compra para otimizar suas comunicações de marketing e conquistar clientes de outras marcas, ou para reter clientes existentes que procuram o que seus rivais têm a oferecer.
Essas parcerias de dados, ou mesmo colaborações de dados, estão emergindo durante toda a jornada do cliente, com diferentes parceiros e em diferentes estágios. Na fase de ‘Consideração’, os clientes analisam as diferentes marcas e modelos, os tipos de combustível, o financiamento, o seguro. Se eles estão pensando em mudar para um EV, eles vão consultar as tarifas de carregamento, carregadores domésticos e assim por diante. Portanto, um fabricante procurará mercados, revendedores, sites de comparação, seguradoras e empresas de serviços públicos como possíveis parceiros de dados.
À medida que o cliente passa para a fase de ‘Compra’, os marketplaces, as redes de concessionários e as financeiras tornam-se cada vez mais relevantes, juntamente com os dados do próprio fabricante. Em seguida, após a compra, as fontes de dados mudam novamente para incluir as redes públicas de recarga ou até mesmo cadeias de restaurantes.
Formas de trabalhar em conjunto
Assim como eixte um espectro de parceiros de dados em potencial, há vários modelos diferentes de cooperação, todos necessitandoser gerenciados por meio de um espaço limpo de dados para colaboração segura e com privacidade assegurada.
Existe a colaboração de dados, na qual os parceiros compartilham dados para benefício mútuo. Por exemplo, um fabricante e uma empresa financeira podem compartilhar dados sobre consultas de clientes, em que ambos obtém oportunidades de vendas um do outro.
Licenciamento de dados significa que os proprietários de dados fornecem dados a um fabricante para geração ou ativação de insights. Talvez os proprietários de uma rede de carregamento de EV vendam dados sobre a frequência alta, média e baixa de uso, que o fabricante poderá usar para ajudá-los a propor a cada cliente o veículo que mais mhe convém.
A mídia baseada em dados será familiar para qualquer um que tenha acompanhado o crescimento da mídia comercial recentemente, em particular da mídia de varejo. Qualquer empresa que comunica regularmente com seus clientes pode atuar como proprietária de mídia, fornecendo a uma outra empresa interessada nesses clientes uma oportunidade de publicidade direcionada. Um exemplo seria uma empresa de serviços públicos promovendo a oferta direcionada de um fabricante em suas páginas de leasing, com base em sinais de intenção no mercado.
Por fim, as marcas podem estender sua colaboração de dados para o co-branding (associação de marcas); fazendo ofertas conjuntas para uma base de clientes combinada.
Novo jogo, novas regras
Algumas dessas abordagens – em particular o co-branding – serão familiares ao setor automotivo. Outras exigirão novos pensamentos e novas abordagens de alguns ou de todos os participantes. Os dados são a ferramenta mais poderosa na caixa de qualquer empresa, mas seu uso é rigidamente regulamentado, além de estar sujeito a regras feitas por gigantes da tecnologia como Google e Apple. Qualquer empresa que queira iniciar qualquer tipo de colaboração de dados precisará estar ciente dessas regras e regulamentos, e é isso que examinarei em meu próximo post.